quinta-feira, 24 de julho de 2008

O meu Deixo


Deixo que no meu peito ardam às dores perpétuas humanas.
Assim como deixo em meus olhos a chama da vida angustiante que é o próprio viver.
Deixo nos meus dedos a declamação das minhas poesias falácias, tempestuosas e que me doem.
Assim como deixo em meu coração, as aflições daqueles que amam e são renegados por amarem diferentes.
Deixo nas minhas frágeis pernas as marcas dos duros fardos que o destino me fez carregar.
Assim como deixo em minha boca o silencio daqueles que não tinham voz para falar.
Deixo no meu amor recalcado as duras penas da minha epifania.
Assim como deixo nas minhas alegrias inativas todas as palpitações de quem tinha dentes e não sabia sorrir.
Deixo o meu otimismo para os pobres, leigos e ignorantes.
Assim como deixo o meu pessimismo para aqueles que entendem e tem medo do seu medo.
Deixo a minha arte como uma dor que me arde, para que todas se firam se queimem e sintam que tudo em mim pulsa e queima.
Assim como deixo tudo que não foi dito, por medo de ser esclarecido.
Deixo assim o medo estampado, disso que sei e não pode ser revelado.
Assim como deixo todas as minhas águas e o meu fogo. Para que haja vida na minha morte. E Estacon em minha vida.
Deixo os meus delírios loucos, irreveláveis e intangíveis.
Assim como deixo tudo que já toquei e transformei em pó, dor e poesia.
Deixo a minha vida num festejo de chão ácido, que ao dançar sobre o seu solo, fere, não pára, agoniza e geme.
Assim como deixo a mim mesma para aqueles indecentes que me amaram, nessa minha dura e sensível forma de ser.


Daniella Paula

quarta-feira, 16 de julho de 2008

A Paisagem Rejeitada


A paisagem rejeitada

A minha rústica paisagem.
Que exala meus diversos perfumes
Que nutri os mais variados gêneros e gênios
Que não é doce nem amarga, é tão somente gim.
Ela se desfaz quando não há o voraz
O voraz de almas perdidas que orientam sua trajetória.
Nela caminham os espíritos andarilhos, que não tem morada, nem estrada.
Nela se liquefazem as lágrimas das cachoeiras em protesto às angustias terrenas e o dramalhão divino.
A paisagem que sustenta as ninfas sem deuses, os anjos sem proteção, os loucos sem compreensão.
Nela não há luz; para que todos sejam estrelas.
É a progênie das sementes abortadas, dos aromas indesejados, dos fetos rejeitados.
Ela é o pulsar das contradições que dão vida a sobrevivência; os ruídos que empertigam a viver.
Essa paisagem se contrai como dores de cóleras e como a alegria sublime do susto de estar vivo.
Não se remete a ser sabiá, mas se orgulha em ser carcará.
Ela, que incorpora os santos não canonizados, e sabe que é sempre melhor ser filha da outra.
Não é a paisagem melancólica e elitista esculpida na obra de arte no canto da sala, nem tão somente o protesto dos desvalidos. É mais a inteligência do pessimismo e a vontade do otimismo, do que a banalidade do grito. Já que tudo é grito.
Ela prefere manter-se estática, como tal é uma paisagem; silenciosa e intrépida.
E que grite ao vê-la...
Os parasitos que se enclausuram.
Os hedonistas doentios.
Os tacanhos insensíveis.
As donzelas desnudas e noturnas.
Os megalomaníacos com suas Torres de Babel.
Subjetiva é a paisagem. Absoluta é sua linguagem. Rejeitada é sua utopia.
E que se afligem os que não entendem a hermenêutica da tela.

Daniella Paula